quarta-feira, 23 de maio de 2012

24 de dezembro, 2007

Não sei se pelo desespero causado pelos anos ímpares, ou se pela consciência da magia das noites de Natal, há tantas décadas perdida, mas hoje não consigo pensar em mais nada se não naquilo tudo que um dia tive, que, parte por parte, vi partir.
Desço as escadas que levam para a sala de estar, e posso sentir a cada degrau a suavidade daqueles passos que um dia acompanhavam os meus. Sento-me no piso encardido da varanda, por entre folhas secas e garrafas quebradas, e posso vê-la lá fora, girando livre, calma, viva, de olhos fechados e braços abertos.
Caminho até a praia, deixando que o cheiro de temporal guie-me para longe, longe daqui, longe dessa casa vazia, desse peito enferrujado, para perto dos cômodos esquecidos, por entre as portas trancadas, para perto das memórias que rangem e que há anos recuso-me a ouvir.
E lá está ela, linda em sua camisola de seda. Lá está ela, minha eterna Konstantine, puxando-me pelos braços, aninhando-me entre seus cachos ruivos, entre seu aroma de canela, café e baunilha. Lá está ela, rindo pra mim, rindo de mim. Deitando na areia úmida, esticando suas pernas pálidas e magras, cobrindo o rosto com suas mãos pequenas, enrolando macias mechas vermelhas na ponta de seus dedos. Lá está ela, me chamando pra brincar, me tirando pra dançar, como se sempre fosse outono, como se sempre houvesse tempo para um último valsar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário