sexta-feira, 4 de junho de 2010

Esqueci o quanto a amo, esqueci porquê a amo. Esqueci do cheiro dela, do gosto, das cartas e defeitos encantadores. Esqueci de seu sorriso, de seu cabelo bagunçado quando acorda. Esqueci de seus olhos inchados, suas cicatrizes que eu daria um pedaço de mim para que nunca tivessem sido feridas. Esqueci da cor de pele dela, dos lábios, das bochechas rosadas, dos olhos cansados, e do queixo gordinho.
Esqueci todas as coisas. Simplesmente esqueci. Ofendo-a, falo verdades que não seriam verdades se eu soubesse o quanto a amo. Grito, resmungo, respondo, não ligo, não me importo, não sinto falta, não quero mais. Deixo tudo de lado, tudo largado, deixo claro não te querer mais. Tiro minhas coisas da sua casa, me revolto por não me pedir pra ficar. Volto para minha casa.
Fecho olhos, existe um vazio. Lembro de tudo. Lembro de seu cheiro, seu sotaque, sua voz, suas palavras, seu toque, seus cinzeiros pela casa. Lembro de você e eu. Não só de você, não só de mim. Lembro de Nós. Como se sempre tivesse sido nós. Eu não quero que o nós passe a ser Ela e Ela, Eu e Você, Eu e Ela, Ela e Você. Não quero uma separação, uma divisão ou qualquer coisa do tipo. Você é minha, nós somos nós, não podemos ser outra coisa.
Visto-me com sua cor favorita, compro doces e sua bebida predileta. Tento pensar em algum discurso de desculpa do caminho de minha casa a sua, não penso nada, não sei o que falar, e por algum momento penso que seria mais fácil não falar nada, não fazer nada, voltar e esquecer tudo de novo. Bato na porta. Espero. Um minuto. Bato de novo, mais forte. Dois minutos. Bato de novo, mais forte. Três minutos. Suspiro, bato o pé esquerdo no chão. Quatro minutos. Reviro os olhos, pensando em todas as vezes que disse para instalar uma campainha. Bato de novo. Cinco minutos. Grito seu nome. Seis minutos. Ando pela varanda, pensando em arrombar a porta. Sete minutos. Tento olhar pela janela, existem roupas na escada. Não são suas roupas. Oito minutos. Penso em traição, penso em correr para um bar e beber todas as porcarias que eu ver. Nove minutos. Beber não funcionaria. Irei injetar algo nas veias. Dez minutos. Dou um soco forte na porta e viro de costas. Desisto. Largo os doces no banco perto do vaso de flor. Tentando não lembrar do verão que passamos ali. Viro e desço as escadas.
A porta abre. Você sorri. Viro levantando o olhar. Devolvo um sorriso amargo, triste e quase molhado. Você desce alguns degraus, me olha de novo, e então volta os olhos para a varanda. Enxerga os doces, e me devolve um sorriso infantil. Sussurro um pedido de desculpas. Você me olha triste. Sussurra algo sobre isso se repetir, sobre não ser mais a mesma coisa. Não escuto nada, não quero escutar, não quero saber. Vou embora. Volto pra casa, fecho os olhos. Existe um vazio.

Um comentário:

  1. Triste, doido e forte... cmo sempre. Odeio ficar nessa duvida se estou ficando fortemente abalado por um sincero desabafo, ou uma inspirada ficção.
    Mas não muda, não importa. Algo assim não tem como ser escrito por dedos saltitantes...
    O frio que se "diz" iminente em relações. Não há cinto de segurança, paraquedas, airbaig, colete que possa segurar o baque, amenizar a força da tristeza ou decepção. E dae voltamos pro nosso mundo que volta a ser apenas nosso [do "eu"] e ser obrigado a aceitar isso é uma tortura.
    Como o tempo voa quando é proveitoso, e como se arrasta quando não é mais...
    Um apertado abraço e um grande beijo no cabelo roxo ;)

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