sábado, 1 de janeiro de 2011

Rabiscavam, no asfalto imundo do centro da cidade, duas linhas grossas e paralelas. Corriam, os brancos traços, pela escuridão por trás dos passos de quem os traçavam.
As calçadas mal iluminadas estavam vazias, e as ruas raramente recebiam a luz de algum farol, o ranger de algum motor. Esse silêncio inquebrável fazia com que o som estridente dos gizes sobre o asfalto machucasse ainda mais os ouvidos de quem os guiavam, que penetrasse ainda mais fundo nas entranhas de seus artistas. E isso tudo doía tanto nele, e tão pouco nela. Konstantine parecia não sentir nada, tão indiferente em seu afazer.
A distância entre os traços que aumentava e diminuía frequentemente não parecia incomodá-la, assim como a persistência do traço ao lado em aproximar-se não a incomodava. Eram apenas traços, apenas gizes sobre o asfalto, apenas corpos estranhos cambaleando pelas avenidas vazias, traçando com imperfeição mais um romance barato.
E seu risco corria pela valeta, contornava bueiros, falhava em certos pontos, e vez ou outra corria bruscamente, invadia o outro traço, cruzando-o diversas vezes e então se afastando com a mesma pressa. Repetiu o mesmo traçar até que seu giz perdeu a cor e seus pés perderam os passos, a urgência.
Konstantine sentou-se sobre o meio-fio fitando a solidão do traço que se traçava a sua frente, sentindo finalmente o seu traçar. Tarde demais.

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