Joguei-me ao velho assoalho do quarto. O som do rádio percorria a antiga casa, penetrando por cada fresta que a madeira deixava, como se as notas dançassem pelo ar sujo e frio que envolvia a tudo.
Um pequeno fio de luz tocou meu rosto, me acordando do êxtase de exploração das notas. Estava mais uma vez sozinha, jogada na bagunça de um quarto quase-escuro, me jogando por entre as memórias de pessoas que não eram minhas conhecidas, entre notícias antigas de jornais novos, entre café e doces que eu não comia.
Fiquei por um tempo absorta a essa situação já comum, aproveitando-me de meu drama, de minha fossa. Foi quando deixei meus olhos correrem pelo quarto e perceberem coisas que eram novas. Havia uma mala entreaberta no canto esquerdo, de lá saiam roupas negras, azuis escuras, verdes e de cores novas, nunca antes vistas naquele lugar. Havia uma mochila cheia de livros de autores desconhecidos no outro canto do quarto, uma Polaroid jogada na cama, uma cama a mais arrumada, xícaras a mais espalhadas pelas cômodas e cheiros novos.
Misturavam-se com o cheiro já antigo de café, algumas novas fragancias. Cheiro de leite com chocolate, cheiro de perfume francês, cheiro de cabelos molhados, cheiros que se encaixavam ao novo ambiente. Novo Ambiente. Não era a mesma coisa de sempre, eu não era a mesma pessoa que era nas outras vezes. Eu não estava sozinha, havia mais alguém no quarto, mais um coração pulsando ao meu lado.
Estiquei minha mão direita e senti sua mão fria e pálida. Giovana, eu esperei por ela todas as noites de inverno, e nas de verão também. Eu apenas esperei para ter seus braços nos meus, suas coisas se misturando com as minhas, seus cheiros com os meus, seus cabelos molhando minhas fronhas, seu corpo modificando a imagem de meu espaço, invadindo minha vida, e me fazendo nem sequer me importar. Fazendo-me desejar isso.
Havia alguém comigo no quarto.