Sentada em minha frente, com seus olhos castanhos impacientemente fitando os cubos de açúcar e suas pernas prendendo e desprendendo das minhas por debaixo da mesa de mogno envelhecido. Suas pálpebras sutilmente inchadas, trazendo rastros da noite passada, da negra tinta, do sono deixado de lado entre seus lençóis.
Seus lábios marcados por beijos de outras bocas que não a minha, deixando escapar com rouquidão mais uma das melodias que só tocam dentro dela. Sua nuca úmida, seus cachos negros e grossos inozando-se e aderindo a pele pálida de seu pescoço. Suas mãos finas e macias, trazendo na ponta de seus dedos o cigarro que acendera e esquecera ali, entre o resto escarlate de suas unhas.
Hora ou outra deixava seu olhar preso ao meu por longos segundos, e então desviava com pressa, perguntando-me sobre o tempo, sobre os gatos, sobre o trabalho e o apartamento novo. E eu respondia que tudo bem, que estava tudo bem, que o gato sentia sua falta, que a vista era bonita e que o trabalho não era aquelas coisas. E ela sorria, fingindo entender, fingindo se importar.
Ajeitava-se na cadeira, esmagando a ponta do cigarro contra o cinzeiro, levando até a boca o café morno da xícara. Fitava-me outra vez, movendo seus traços como se tivesse algo para contar sem saber como, sem saber ao certo o quê. Voltava aos poucos a fixar seus olhos opacos aos cubos úmidos de açúcar, a estampar em seu rosto seu sorriso torto e falso.
E eram assim todos os sábados, café morno, cadeiras escorregadias, cigarros desperdiçados, pernas entrelaçadas, silêncio e aquela coisa nunca dita, que fazíamos de conta que sequer existia, que sequer existiu.
Gosto muitíssimo dos seus textos, minha querida. São tão descritivos que se tornam praticamente reais aqui bem na minha frente...todo o cenário, os personagens, os sons, tudo! Muito bom mesmo. Escreves bem. Parabéns! Beijos.
ResponderExcluirbelas palavras me fizeram viajar seguindo as frases.
ResponderExcluirÉ sua autoria!?
Estou seguindo.