domingo, 3 de outubro de 2010

Caminho, com pressa e solidão, pelo ar morno e agreste do início de tarde. Os músculos de meu abdômen, perdidos pela blusa de moletom azul, larga e manchada de tinta, se contraem, outra vez, em uma dor calma e constante, a qual o hábito de ignorar tornou quase inexistente.
Meu peito infla e murcha debilmente, sendo o ar pesado demais para ser respirado, sendo os pulmões frágeis demais para absorver o ar que, com dificuldade, as narinas empurram em sua direção.
Paro, fatigada, em frente a grande janela de vidro, com um enorme logotipo centralizado, de uma dessas lanchonetes baratas, que misturam papel de parede engordurado com estofados vermelhos e piso xadrez que uma pré-adolescente ajoelhada e calçando patins, esfrega com desgosto.
Não demorou muito para que meu olfato encontrasse com o cheiro de fritura e refrigerante, e meu estômago, histericamente, roncasse. Meus olhos, cansados, correram pelas mesas cheias, pelas mãos gordas e peludas que seguravam um hamburguer e o dirigiam a boca. Os dentes amarelados mordendo com rapidez, e antes mesmo que terminassem de triturar o alimento, as mãos enfiavam um outro pedaço. Dedos finos, unhas compridas e escarlates, segurando uma ou duas batatinhas, dirigindo-as até os dentes sujos de batom, mordiscando com calma o alimento engordurado.
Um dia, me diga, um dia eu conseguirei sentar em uma dessas lanchonetes, comer sem que minha mente me culpe? Sem que o espelho me condene? Sem que meus olhos umedeçam, que meu peito doa, que minhas mãos corram com nojo por meu ventre, cochas e braços? Diga, por favor, diga que sim. Diga que um dia eu serei livre, que minhas unhas roídas jamais arranharão minha garganta novamente, que nenhuma lâmina rasgará minha pele, que eu nunca me sentirei tão horrível.
Diga que algum dia poderei me orgulhar do que vejo no espelho, que minha imagem não vai me machucar, que eu nunca mais, nunca mais, sentirei culpa por um crime que não cometi. Apenas me salve, porque eu não suporto mais.

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