terça-feira, 11 de maio de 2010

Fechei a porta, atirando as botas molhadas em um canto qualquer, junto ao guarda-chuva. Deixei o grosso casaco em um encosto de cadeira, jogando por cima os cachecóis, e algumas camadas de lã.
Sentei-me ao chão, de frente para a lareira, pendurando as pequenas luvas, daquelas que os dedos mostram rostos sorridentes, em um dos pregos que no natal servem de apoio às meias. Senti o calor de fogo aquecer meu corpo rapidamente, e o aroma de lenha queimando tomar conta de meu olfato, e então corri para longe, buscando algumas cartas e algum líquido quente.
Voltei com um copo térmico, chocolate quente com pequenos pedaços de marshmallow era tudo que eu precisava para controlar as dores do que eu estava prestes a fazer. Abri a caixa antiga, daquelas que ainda possuem cheiro de couro e mofo, jogando as cartas perfumadas ao fogo, sem nem olhá-las.
O perfume, que anteriormente era exclusividade da pequena caixa, agora tomou conta da sala, dos quartos, da cozinha. Os papéis queimaram rapidamente, misturando seus cheiros e cores aos da lenha.
Fiquei observando os pedaços mais resistentes, que bravamente lutavam contra as chamas, que aos poucos iam se entregando, e virando brasa, cinzas, e coisa alguma. Se tudo naturalmente acaba, se nada é feito para durar, por que resistir? Por que lutar? Por alguns segundos a mais de oxigênio? Acho que não está valendo a pena.
Corri meus braços para a outra caixa, com mais cartas, ainda maiores e ainda mais perfumadas. Fiquei dividida, não parecia certo me desfazer daquilo. Eram pedaços de mim, eram histórias que eu gostaria de contar, de lembrar perfeitamente. Eram palavras que haviam feito cada parte minha se juntar as partes de outro alguém, formando um elo aparentemente imutável. Mas nada é feito para durar. Joguei as cartas ao fogo, virei as costas, ignorei o doce aroma de cartas românticas, a doce fragrância de palavras que demonstram um amor falso, a doce ilusão de não ter um coração partido.
Melhor partido do que queimado, pensei.

"I'm miles from where you are,
I lay down on the cold ground
I, I pray that something picks me up
And sets me down in your warm arms"

Nenhum comentário:

Postar um comentário